Finalmente voltei a ler e já terminei um livro. Bem, pra ser honesta, era um livro de ficção de leitura fácil, então não tinha como enrolar muito, se eu me esforçasse um pouquinho eu conseguiria terminar, e foi o que eu fiz.
Faz um tempo que não faço posts sobre leitura, e eu só fiz um em toda a história recente do blog, então não tenho muita certeza de como começar. Mas seria bom começar do começo.
Eu li Rádio Silêncio da Alice Oseman. A autora num geral tem obras boas, eu adoro Heartstopper dela, apesar de só ter lido o primeiro volume, mas é muito gostosinho de ler e os desenhos são super bem feitos e fofinhos. Comecei esse livro há um tempo, mas aí a faculdade começou e eu meio que parei com todas as leituras. Além disso, não sei muito sobre Alice, só que ela deve ser uma pessoa branca britânica, mas não sei onde ela se encaixa dentro da comunidade LGBT, só que usa pronomes ela/elu. Nunca senti muita curiosidade em conhecer mais sobre ela, eu li dois livros dela até hoje contando com este abaixo e, por mais que sejam obras legais, nada nunca me cativou a ponto de eu me tornar uma fã, mas eu já vou chegar nesse ponto dentro da minha crítica.
Este ao lado é o livro que vou resenhar, para poupar vocês de algumas pesquisas. Ele foi lançado em 2016 aqui no Brasil pela editora Rocco, mas eu li em ebook através de um app chamado Árvore, que é tipo um aplicativo de leitura que as bibliotecas municipais de São Paulo usam. Eu me cadastrei em uma das bibliotecas e, apesar de não visitar lá pessoalmente por não ser tão perto, o cadastro me garante acesso a biblioteca digital.
Para fazer um resumo não tão resumido pois sou prolixa, esse livro é sobre Frances, uma garota inteligente e superestudiosa que orbita em volta do academicismo, aulas, livros didáticos e seu futuro curso na faculdade. Tudo pra ela é sobre isso e é o que ela mais quer na vida. Porém, tem um lado da Frances que ninguém conhece: ela é hipermegafã de um podcast de ficção chamado Universe City, e faz fanarts dos personagens desse podcast. Esses são seus hobbys. A identidade do criador do seu podcast favorito é um mistério, até que ela descobre quem é do jeito mais inusitado: um garoto que ela encontra super bêbado em uma festa, e que era irmão de uma de suas melhores amigas, ou pelo menos um dia já foi uma melhor amiga. O livro vai contar como a amizade entre Frances e o criador do seu podcast favorito acontece e os problemas que ele terão que enfrentar.
Essa é uma pequena introdução para quem não leu mas gostaria de ler o livro, sem spoiler porque essa parte do encontro dos personagens acontece bem nos primeiros capítulos. A partir daqui, as minhas críticas virão recheadas de spoiler, então se você ainda quer ler o livro e/ou se incomoda com spoiler, já deixarei avisado. Eu já tinha resenhado esse livro no Maratona, que é um aplicativo de acompanhamento e registro de leitura, então muita coisa que eu comentar aqui eu vou estar me "inspirando" no que eu falei lá.
Como eu mencionei, eu já li outras coisas da Alice, e uma delas foi um livro chamado Sem Amor, que segue uma temática parecida a essa de amizade mas é muito mais focado em descoberta de sexualidade, e os personagens já estão na faculdade. E para mim, eu tive problemas muito parecidos na leitura dos dois livros, me geraram a mesma sensação, e essa sensação é um vazio. Não um vazio existencial, o qual você reflete sobre e realmente muda algo na sua vida, mas um vazio de está faltando alguma coisa, de que o livro não ficou completo.
A Alice te dá personagens, te dá vivências, te dá conflitos, te dá acontecimentos bons e ruins, mas não te dá um desfecho. Tudo isso que ela criou, ela não faz nada com eles.
Foi o que eu escrevi na minha resenha e é exatamente isso. Parece que ela só escreve pela aventura, mas não dá profundidade às coisas, as coisas ficam sem um final, certo ou incerto, qualquer final que seja, e fica tudo meio que perdido em um limbo. São várias as pontas soltas nesse livro, e na minha resenha eu chego a pontuá-los.
Como eu expliquei ali em cima, o criador, que agora já posso dizer que seu nome é Aled, tem uma irmã, Carys, e Frances foi amiga de Carys antes de reencontrá-lo, porém Carys de repente foi embora e Frances se culpava pela partida dela. O que, sinceramente, não faz nenhum sentido, porque a única coisa estranha que aconteceu entre elas foi que Frances estava se apaixonando pela Carys (Frances é bi e Carys é lésbica) e um dia a Frances beija ela, e na cabeça dela esse foi o motivo dela ter ido embora. Tipo, sério mesmo que uma pessoa sairia da casa dela, da cidade dela, por causa disso? Era tão óbvio que tinha algo mais sério acontecendo, mas ok, se a autora quer que a gente acredite nisso, a gente dá uma forçada. Enfim, lá pro final do livro o Aled começa a ficar muito mal, a vida dele toda tá aos pedaços, cada vez mais se isolando das pessoas que ele ama, e uma das coisas que mais chateia ele é a saudade da irmã, já que ele não sabia onde ela estava. Por causa disso, Frances decide ir atrás dela pra que eles se reencontrem, conversem e quem sabe ela não ajude o Aled. Mas aí, após o climax da história, o livro chega ao final e fica só por isso. Tipo, não desenvolve muito a relação de irmãos dele, porque quando eles se reencontram eles são interrompidos (já vou explicar como), mas depois não acontece mais nada para que eles conversem e chegue a um desfecho na história deles, que era literalmente todo o tema de mistério na história e o motivo pelo qual todas as coisas estavam acontecendo. A história só termina falando sobre o Aled e o que ele vai fazer com a vida dele e a Carys é esquecida, o que eu achei muito triste já que ela tinha um papel muito importante na história toda, e pessoalmente era a personagem mais legal do livro junto de uma outra garota. No final eles se viram uma vez e foi só isso, como se não fizesse meses que eles não se vissem, outra vez uma forçação de barra.
Sem falar na própria relação de amizade entre a Carys e a Frances. A última vez que elas tinham se falado tinha ficado um clima de velório, aí elas se reencontram e fica só por isso mesmo. Até tem uma cena em que elas conversam e pedem desculpas uma a outra, mas é só uma única cena, um único capítulo, sendo que a Frances passa o livro inteiro falando da Carys e dessa amizade e de como ela gostava dela e como sentia saudade e como se culpava etc., etc. A autora deu uma importância tão grande pra relação das duas pra no final resolver todos os problemas em dois parágrafos. A Frances se sentia tão culpada pela partida da amiga, mas em uma única cena ela se livrou de toda essa culpa. Ficou forçado, de novo.
E falado dos irmãos, chegamos ao ponto que estava estragando com toda a vida deles: a própria mãe, Carol. Ela é uma mulher narcisista, controladora e abusiva com os próprios filhos. As coisas que ela fez com a Carys foram o motivo pelo qual ela foi embora para Londres, e as coisas que ela fez com Aled foram o motivo pelo qual ele estava se isolando e ficando extremamente depressivo. Por causa de tudo que ela representava, o final dela ficou super estranho. Porque, no final, ela é quem atrapalha o reencontro dos irmãos e tenta levar o Aled com ela de volta pra casa, assim ela poderia controlar o que o filho faz, o mandar de volta pra faculdade e fazer um curso que ele odeia, sendo que a maior paixão dele era o podcast. A Frances tenta impedir com que o Aled vá embora com ela falando umas frases clichês e convincentes, e o Aled fica meio "vou-ou-não-vou", até que ele decide fugir da mãe dele e ficar com os seus amigos, que estavam todos ali pro reencontro dos irmãos, já que ninguém via o Aled há muito tempo. E depois disso, a mãe controladora simplesmente some. Não é explicado o que ele fez pra ela sumir, até porque ele não vai mais fazer faculdade, então não tem como ele morar lá, então não se explica se ele vai ficar na casa da Frances, ou se ele vai morar com a irmã, e também não se explica como ele conseguiu que a mãe o deixasse em paz. No livro, relata como ele sempre foi o irmão favorito por ser mais inteligente, então como uma mãe monstruosa e megera daquelas deixaria um bando de adolescente de 17 anos levar dela o próprio filho cuja vida ela controlava cada aspecto? Como ela não começou a ligar pra ele? Como ela não foi bater na porta da Frances pra ir atrás dele? Ficou parecendo que ela aceitou facilmente tudo isso, ou seja, ela nem era uma ameaça tão grande assim e o Aled poderia ter se livrado dela há tempos antes dela ter feito todas as merdas que ela fez na vida dele. De novo, outra coisa forçada. Afinal, a Carys, que tinha a mesma idade que ele, tinha conseguido ir embora e viver a vida dela em paz, por que ele, na faculdade e tudo, recém 18 anos nas costas, por que ele não conseguiria só mandar ela ir pra casa do chapéu e viver a vida dele também? Sei como é difícil enfrentar nossos próprios pais, mas quando eles fazem coisas horríveis com a gente, é necessário, você precisa mostrar que você é uma pessoa e não um bonequinho que eles podem colocar onde quiserem. Ou você faz isso ou você morre por dentro, às vezes até morre de verdade.
E ainda sobre o Aled, dentro do grupo de amigos dele tinha outra pessoa, o Daniel, ou Daesung, um garoto gay descendente de pais coreanos. Eles tinham uma relação romântica que estava ruindo pois o Aled não conseguia expressar bem seus sentimentos e nunca falava o que pensava, e por causa disso o Dan achava que o Aled só fingia gostar dele. Aí, de repente, lá pro final, a autora solta a informação que o Aled se identificava como assexual. Essa informação ficou extremamente perdida, porque no livro todo foi falado que o problema dele era em dizer o que estava sentido, que ele tinha problema em conversar, e não que ele tinha uma questão com sexo. Foi extremamente do nada e ficou muito desconexo. Acho que até fez um pouco de sentido quando ele disse que estava evitando ele porque não sabia como contar pra ele que era assexual, mas faltou dicas no livro que apontasse pra isso.
Lendo até aqui, dá pra reparar o quanto eu falo do Aled, mesmo quando falo da Frances tem o Aled envolvido. Sendo que a Frances é a protagonista do livro. Pois é, isso é algo que eu já senti em Sem Amor também, o fato das duas protagonistas estarem tão apagadas da história. Às vezes dá a impressão da história estar sendo contada em segunda pessoa, como se o narrador fosse alguém olhando tudo de fora, porque as protagonistas nunca tem um destaque e um desenvolvimento significativo pra história. Isso acontece tanto que você só vai reparar que tem uma crítica sobre a escola da Frances no livro bem mais pra frente, porque o livro todo só parece que a Frances precisa muito de validação acadêmica, quando na verdade a escola dela que é super opressora e entra na cabeça dos alunos para que eles se matem de estudar, porque a autora faz parecer durante o livro todo que a Frances é a única "nerd" e que é apenas uma escola normal, mas aí em raras vezes o livro descreve atitudes abusivas que a diretora da escola tem com os alunos, como fazer com que substituam o horário de almoço com estudos e só possam comer por 10 a 15 minutos. Você entende que a autora quer fazer uma crítica ao sistema educacional, mas ao mesmo tempo essa crítica não é bem feita e bem construída, então acaba que ela se perde. E sobre a Frances, o problema dela com a faculdade também só é mencionado lá na metade do livro e apenas uma ou duas vezes. Sabemos desde o começo a paixão dela por desenho e arte, mas como no livro isso é só tratado como hobby, só fica parecendo que é apenas um hobby e que na verdade a paixão dela é outra coisa, e por isso ela escolheu literatura como curso para faculdade, mas aí no final do livro descobrimos, junto com a protagonista, que ela na verdade não quer fazer faculdade e só quer viver de podcast e seus desenhos junto com Aled. O que é ótimo, mas foi desenvolvido de qualquer jeito, nunca soubemos sobre a Frances o suficiente para saber se ela se questionava sobre essa escolha, ela nunca demonstrou incerteza, ela nunca olhou pra arte dela e pensou "nossa quem me dera trabalhar com isso", nada. Ela tinha absoluta certeza que era aquilo que ela queria, e de repente ela só não queria mais.
A autora focou tanto em Aled que se esqueceu de Frances. Focou tanto em Aled que se esqueceu de Carys, de Daniel, de Raine — a outra amiga deles que é uma personagem que eu gosto bastante —, de Carol, de todos. Essa era uma história sobre Aled, não Frances, e isso me deixou meio frustrada. E mesmo que Aled ganhasse todo esse destaque, até o desenvolvimento dele ficou meia boca por tudo isso que eu comentei, mas também porque havia todo um mistério acerca do podcast dele e sobre quem seria uma personagem específica chamada February, que logo descobrimos que era para representar a irmã dele, e diga-se de passagem esse mistério nem foi tão misterioso assim, eu já tinha sacado isso há uns bons capítulos antes de ser revelado. No fim do livro, nada tem um final fechado de verdade, mas não é como se fosse um final aberto proposital, são só coisas que não tem explicação mesmo. Mas apesar de tudo isso ter me incomodado, no Maratona eu avaliei esse livro como "Gostei". Eu sei que pode parecer um pouco hipócrita, e na verdade até o momento eu tô me questionando um pouco sobre essa nota, mas é porque eu genuinamente me senti entretida. Pra mim foi só um livro bobinho que eu li, que até me gerou algumas sensações, e que foi divertido. A escrita me envolveu na história de forma que eu esperava mais da construção do enredo. Acho que se eu estivesse tão desinteressada eu nem teria sentido falta desses pedaços, na verdade teria agradecido pela autora não ter escrito mais e ter acabado logo. Mas eu senti falta e acho que a história teria ficado melhor. No fim, a Alice deveria continuar só nas histórias em quadrinhos, porque essas ela sabe escrever e desenhar muito bem.
Bem, não sei se recomendo esse livro. Tenho uma sensação mista de ter me divertido, mas ao mesmo tempo de ter me decepcionado. E assim, creio que não vá mudar nada na vida de ninguém esse livro, ele passa bem batido.



Nenhum comentário:
Postar um comentário