01 setembro, 2025

lembrete: você mesmo

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Mais uma vez eu me esqueci.

Não só porque deixei de escrever aqui. O blog era só uma parte de mim. Só uma das maneiras de eu me enxergar e lembrar de mim mesma, assim como existem várias outras que eu costumo mais ou menos fazer. Até o momento em que eu não faço mais nenhuma delas: é aí que eu sei que esqueci de mim.

Eu estou tendo que constantemente relembrar de mim mesma, o que é meio triste na verdade. É tão fácil de esquecer a si mesmo que você só percebe isso quando se está sozinho. Porque acho que você só se permite se esquecer quando tem alguém para te lembrar por você. Ou às vezes você não tem ninguém para fazer isso e se esquece mesmo assim, acho que isso acontece com mais facilidade do que podemos imaginar. Convivemos com nós mesmos por tanto tempo que é fácil só lembrarmos da nossa existência quando algo muito intenso acontece, ou só quando nos olhamos no espelho. É fácil de se esquecer algo que não se vê todo dia, e é claro que vemos nossas mãos e braços, até nossos pés e pernas, mas e quando esquecemos do nosso rosto porque ele não está bem a nossa frente? Ou quando esquecemos de olhar para dentro porque perdemos muito tempo olhando para fora. Muito tempo olhando para outras pessoas. E quando essas pessoas não estão por perto, ou vão embora, lembramos que passamos muito tempo sem nos olhar. Nos esquecemos. De novo. Acho que podemos perceber isso quando não temos para quem olhar também.

Sim, eu me esqueci de novo. Passei tanto tempo olhando para outras pessoas que esqueci de me olhar, de me cuidar. E mesmo assim eu ainda acho que me olho demais, mas é porque esqueço que se olhar é só uma parte do cuidar, do se lembrar. Não é porque eu sou muito introspectiva que eu me dê mais importância do que dou aos outros. Penso muito no que se passa comigo, passo muito tempo tentando me entender, mas ao mesmo tempo não gasto toda essa energia ativamente fazendo algo de bom por mim mesma. É como se, por mim, eu ficasse presa na teoria e nunca chegasse na prática. Infelizmente nesse sentido eu sempre inverti as prioridades.

Sempre pensei no que os outros queriam. No que os outros esperavam de mim. No que queriam ouvir de mim. No que eu tinha que fazer para agradá-los. E nas desculpas que eu teria que dar caso eu tivesse errado, porque eu sempre esperava já estar errada. Sempre investi mais meu tempo pensando em como deixar as pessoas ao meu redor felizes do que em me deixar feliz. Sempre dei 200% de mim. Fiz sacrifícios, substitui o que eu era pelo o que os outros eram. Inclusive, chego a acreditar que o grande motivo de eu ser tão introspectiva, de me analisar tanto, seja justamente porque me julgo constantemente para saber se estou correta, se estou o suficiente para os outros, se estou boa o suficiente. Sempre usando outras réguas para medir a mim mesma.

De defeitos eu tenho de sobra, assim como muitas pessoas. Não quero em nenhum momento parecer a pessoa perfeita com esses pensamentos. Já errei com muitas pessoas, muitas delas amigos e pessoas que eu amo. Mas sempre agi como se cada erro meu fosse o fim do mundo, como se automaticamente me tornasse a pior pessoa do mundo. Como se eu merecesse coisas muito ruins por ter dito para um amigo algo ruim do qual eu me arrependeria depois. Acho que, nesse sentido, o arrependimento e a culpa já são castigos o suficiente. Então por que eu não ficava em paz? Por que parecia que nada seria o suficiente para "pagar" pelo o que eu tinha feito? São coisas que, agora, olhando em retrospecto, eu percebo que eram pensamentos que eu normalmente tenho quando estou me esquecendo. Quando eu me olho como se fosse um corpo estranho.

Eu exijo muito de mim mesma. Exijo muito para que eu seja a melhor pelos outros. É legal ser uma boa amiga, uma boa filha, uma boa aluna, mas essas coisas precisam de um limite. E por causa disso, acabo exigindo muito dos outros, para que sejam os melhores comigo. Demorei muito para perceber que tudo isso tá errado. Por que eu não posso ser a melhor para mim? E como os outros, meus amigos, podem ser os melhores para mim o tempo todo sem esquecer de si mesmos? Eu pensava que só estava pedindo um pouco de reciprocidade, e talvez realmente estivesse, mas esse tipo de pedido é um pouco injusto, para se dizer o mínimo. Por que eu tinha que depender dos outros me olharem se eu poderia fazer isso por mim mesma? Ninguém tem que fazer isso por mim. Com isso, não quero dizer que não mereça alguém para cuidar de mim — um amigo para me ouvir, um amor para me amar —, mas sim que o que eu precisava era de um equilíbrio.

Algumas pessoas na minha vida foram bem cruéis comigo. Outras nem tanto, mas foram descuidadas o suficiente para me deixarem para baixo. A maioria das pessoas nunca me fizeram mal, mas eu já estava tão machucada por conta de outras que qualquer coisa minimamente conflituosa que acontecesse já atacaria minha ansiedade. Se eu não precisasse tanto da atenção e da validação dessas pessoas, os danos teriam sido muito menores. Digo isso dessa vez não me culpando, não me julgando. Cansei de só pensar o pior de mim. Digo isso mais como um aviso amigável, mais como uma forma de zelo: dependa menos do afeto alheio, porque quando faltar, por qualquer razão que seja, você não vai ter se esquecido e vai saber que ainda merece ser amada como todo mundo.

Falar sobre isso é muito complicado ainda. Quem é assim nunca se torna desse jeito do dia para a noite. Pessoas assim foram pessoas que, na infância, precisaram fazer tudo sozinha. Foram pessoas que "nunca deram trabalho", que sempre foram a boa filha ou o bom filho. É muita coisa para cavar dentro de mim ainda. Mas só de eu ter dado o primeiro passo já vai ter valido a pena. Pelo menos sei que eu estou disposta e posso fazer esse tipo de coisa por mim. Porque eu ainda valho a pena, assim como qualquer um vale e é digno do que eu tenho a oferecer. Eu também posso ser digna por mim.

Lembrar de si mesmo nunca é uma jornada fácil. Eu já esqueci de várias partes de mim, mas sei que posso lembrar delas de novo. E não me envergonho de todas as minhas tentativas de lembrar, se for necessário eu tentaria lembrar de mim de novo e de novo. Porque talvez, um dia, todo mundo se esqueça de quem eu fui e não preciso nem morrer para isso. Às vezes pessoas são esquecidas ainda em vida. Mas se eu puder lembrar de mim ainda pelo tempo que estou aqui, talvez eu possa viver feliz por ter lembrado, e assim não preciso ser como um fantasma do espaço-tempo, mesmo estando viva.

Mas ei, eu lembrei de mim dessa vez. Não sei por quanto tempo vou continuar lembrando, mas vou me esforçar para lembrar até chegar o momento em que, mesmo que eu olhe para os outros, eu nunca esqueça de olhar para mim do mesmo jeito carinhoso e amoroso que já olhei para outras pessoas. E caso você acabe caindo aqui e leia isso, espero que você esteja olhando para você com o mesmo amor.

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